EXATTUS EDUCAÇÃO ESPECIAL





CAPACITAÇÃO EM EDUCAÇÃO ESPECIAL







NO PATRIMÔNIO ÉTICO-CULTURAL DA HUMANIDADE INTEIRA HÁ UM COMPORTAMENTO QUE NÃO PODE FALTAR: A CONSCIÊNCIA DE QUE OS SERES HUMANOS SÃO TODOS IGUAIS NA DIGNIDADE, MERECEM O MESMO RESPEITO E SÃO SUJEITOS DOS MESMOS DEVERES. João Paulo II





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domingo, 28 de agosto de 2011

Para Refletir


Carta de adeus à professora fantasma

Umas foram a número um, outras nem tanto, mas três foram número zero.
Você passou pela vida do Nicolas e foi como se não tivesse existido. Ou seja, uma verdadeira fantasma!
O pior que pode acontecer na vida do meu filho é alguém fingir que ele não existe.
Ignorá-lo é como maltratá-lo.
É privar o estímulo que o faz evoluir.
Quando alguém faz isso inconsciente tem o meu perdão.
Mas por medo, covardia? Ah, isso eu não tolero!
Você perdeu a chance de conhecê-lo. De amá-lo.
Você nem sabe quais são os seus gostos,
qual é o seu time,
seu herói e filme favoritos,
não sabe o que significa “ao infinito e além!”.
É triste!
A instituição deu para você todas as condições, todas as informações…
cada referência na experiência anterior para que você pudesse firmar um laço, um elo de amizade e cumplicidade.
Mas você ignorou!
Preferiu os dados estatísticos das metas pedagógicas,
e  esqueceu do sorriso no olhar do meu filho!
Um ano inteiro se passou, e logo percebemos que poderia ser assim.
Não pedimos para mudá-lo, pois não somos covardes.
Se era você a sua professora, com você seria o ano letivo.
Só pais como nós, sabemos que a vida colocará outras pessoas que farão o mesmo com ele.
E se esquivar não é o melhor caminho.
Enfrentar sim!
E o Nicolas venceu mais essa etapa.
Mesmo com todas as dificuldades o ano letivo se encerrou e ele venceu, apesar da sua existência na vida dele.
Não desejamos nenhum mal…
mas confesso que a única coisa pude fazer é dar-te esse adeus!
Lamento, pois você não conheceu o Nicolas,
e as pessoas que tiveram esse privilégio, sabem que ele é inesquecível.
Adeus!
Escrito pelo Pai do Nicolas

domingo, 14 de agosto de 2011

DESENVOLVIMENTO DA LINGUAGEM - Myrta Kras

Atividade de recuperação - aula 1
Tema: O que é linguagem

Aos alunos que ainda não entregaram a atividade referente à aula 1, a atividade a ser realizada é a elaboração de comentários sobre o vídeo "O que é Linguagem", explicando com suas palavras o conceito de linguagem.
Bom trabalho!

disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=I1Zusz__3e8

DESENVOLVIMENTO DA LINGUAGEM - Myrta Kras

Estamos nos aproximando do final do módulo "Desenvolvimento da Linguagem".
Convido a todos os alunos a lerem o texto "A Aquisição da Linguagem" de autoria de Ester M. Scarpa.
Após a leitura, elaborar uma resenha, utilizando conhecimentos adquiridos ao longo do módulo, bem como experiências de sua vida profissional ou pessoal.
Texto disponível em: http://www.ronaldomartins.pro.br/psicolinguistica/Scarpa.pdf



AQUISIÇÃO DA LINGUAGEM 


Conteúdo 
1. AQUISIÇÃO DA LINGUAGEM: BREVÍSSIMO HISTÓRICO E ABRANGÊNCIA ............................................ 1
2. TEMAS E ABORDAGENS TEÓRICAS SOBRE A AQUISIÇÃO DA LINGUAGEM .......................................... 3
2.1. O velho debate pendular sobre nature (natureza) versus nurture (criação, ambiente). O inato e 
o adquirido. O biológico e o social ....................................................................................................... 3
2.2. O cognitivismo construtivista: Piaget, Vygotsky ............................................................................ 6
2.3. 0 interacionismo social .................................................................................................................. 8
3. A QUESTÃO DO "PERÍODO CRÍTICO" .......................................................................................................... 12
4. ESTÁGIOS DE DESENVOLVIMENTO DA LINGUAGEM .......................................................................... 15
5. ALGUMAS CONCLUSÕES ........................................................................................................................... 18
1. AQUISIÇÃO DA LINGUAGEM: BREVÍSSIMO HISTÓRICO E ABRANGÊNCIA 
A linguagem da criança sempre provocou especulações diversas entre leigos ou 
estudiosos do assunto. Seja essa linguagem a manifestação imperfeita de um ser 
incompleto, seja a expressão primitiva da palavra de Deus, o fato é que relatos mais ou 
menos esparsos, porém constantes, têm sido registrados ao longo dos séculos e 
chegaram até nós. Tais relatos dizem respeito às primeiras palavras emitidas pelas 
crianças, ou a que condições a criança deveria ser  exposta para aprender a falai
-

Heródoto, por exemplo, narra que, no século VII a.C, o rei Psamético do Egito ordenou 
que duas crianças fossem confinadas desde o nascimento até a idade de dois anos, 
sem convívio com outros seres humanos, a fim de se  observarem as manifestações 
"lingüísticas" produzidas em contexto de privação interativa. Sua hipótese era que, se 
uma criança fosse criada sem exposição à fala humana, a primeira palavra que emitisse 
espontaneamente pertenceria à língua mais antiga do mundo. Ao cabo de dois anos de 
total isolamento, as crianças emitiram uma seqüência fônica interpretada como 
"bekos", palavra frígia para "pão". Concluiu, então, que a língua que o povo frígio 
falava era mais antiga que a tios egípcios. 
Estudos sistemáticos sobre o que a criança aprende  e como adquire a 
linguagem, porém, foram feitos, como tais, apenas mais recentemente. Desde o século 
XIX, alguns lingüistas, guiados tanto por interesse paterno quanto profissional, 
elaboraram diários da fala espontânea de seus filhos. Algumas das amostras mais 
abrangentes da fala infantil foram registradas nas  primeiras décadas deste século 
pelos chamados "diaristas", que eram lingüistas ou  filólogos estudando seus próprios 
filhos. Os mais interessantes deles são um estudo do francês por Antoine Grégoire, um 2 
sobre a aquisição bilíngüe alemão-inglês de Wcrner Leopold (1939), além do trabalho 
de Lewis (1936), sobre a descrição de uma criança aprendendo o inglês. São trabalhos 
descritivos e mais ou menos intuitivos, que, ao contrário das pesquisas aquisicionais 
das últimas décadas, não se voltam à procura, nos dados da criança, de evidência em 
prol de alguma teoria lingüística ou psicológica, embora se insiram nas teorias 
lingüísticas e psicológicas da época (como o de Lewis, com tendência behaviorista). 
Esses trabalhos são do tipo  longitudinal,  uma das metodologias de pesquisa 
com dados de desenvolvimento hoje já bem estabelecidos, iniciada exatamente pelos 
diaristas. Trata-se do estudo que acompanha o desenvolvimento da linguagem de uma 
criança ao longo do tempo. As anotações, em forma de diário, do que a criança diz, em 
situação naturalística (isto é, em ambiente natural, em atividades cotidianas), foram 
posteriormente substituídas por registros em fitas  magnéticas, cm áudio ou vídeo. 
Assim, grava-se a fala de uma criança por um período de tempo preestabelecido (por 
exemplo: meia hora, 40 minutos, 1 hora etc), em intervalos regulares (sessões 
semanais, quinzenas, mensais etc), dependendo do tema a ser pesquisado. Esse 
material é posteriormente transcrito da maneira mais apropriada para a pesquisa em 
pauta (transcrição fonética, prosódica, cursiva, codificada segundo orientações 
sintáticas, semânticas etc). A suposição é que. registrando-se uma quantidade razoável 
da fala da criança de cada vez. pode-se ter uma amostra bastante representativa para 
se estudar como o conhecimento da língua pela criança é adquirido e/ou como muda 
no tempo. A partir da metade dos anos 1980, bancos  de dados da fala de várias 
crianças do mundo todo têm sido formados, seguindo  codificações informatizadas. 
Uma outra metodologia de pesquisa em aquisição da linguagem, a de tipo transversal, 
baseia-se no registro de um número relativamente grande de sujeitos, muitas vezes 
classificados por faixas etárias. Embora não exclusivamente, a pesquisa de tipo 
transversal geralmente também é do tipo experimental (por oposição a naturalístico), 
em que os fatores e as variáveis intervenientes no  fato analisado são isolados e 
controlados e depois testados. 
Dados naturalísticos destinam-se sobretudo à análise  da produção;  os 
experimentais prestam-se mais à observação e análise da percepção, compreensão e 
processamento da linguagem pela criança. De qualquer maneira, deve-se sempre ter 
cuidado com a visão ingênua de que os dados aquisicionais "falam". A metodologia 
adotada e a própria seleção dos dados dependem da postura teórica que norteia a 
pesquisa. 
A Aquisição da Linguagem é, pelas suas indagações,  uma área híbrida, 
heterogênea ou multidisciplinar. No meio do caminho entre teorias lingüísticas e 
psicológicas, tem sido tributária das indagações advindas da Psicologia (do 
Comportamento, do Desenvolvimento, Cognitiva, entre outras tendências) e da 
Lingüística. No entanto, na contramão, as questões  suscitadas pela Aquisição da 
Linguagem, bem como os problemas metodológicos e teóricos colocados pelos 
próprios dados aquisicionais, têm, não raro, levado tanto a Psicologia (sobretudo a 
Cognitiva) como a própria Lingüística a se repensarem c a se renovarem. Por isso é que 
se diz que a Aquisição da Linguagem tem sido uma arena privilegiada de discussão 
teórica tanto da Lingüística quanto da Psicologia Cognitiva
3
. Hoje em dia, a Aquisição 
da Linguagem alimenta os tópicos recobertos pela Psicolingüística,
4
 além de ser de 
interesse central nas ciências cognitivas e mesmo nas teorias lingüísticas, sobretudo 3 
nas de inspiração gerativista, como veremos mais detidamente adiante. A área recobre 
muitas subáreas. cada uma formando um campo próprio de estudos. Eis algumas 
delas: 
a) aquisição da língua materna, tanto normal quanto "com desvios", recobrindo 
os componentes "tradicionais" dos estudos da linguagem, como fonologia, semântica e 
pragmática, sintaxe e morfologia, aspectos comunicativos, interativos c discursivos
5
 da 
aquisição da língua materna. Sob a égide de "desvios", contam-se: aquisição da 
linguagem em surdos, desvios articulatórios, retardos mentais e específicos da linguagem etc; 
b) aquisição de segunda língua,  quer como bilingüismo infantil ou cultural, 
quer na verificação dos processos pelos quais se dá a aquisição de segunda língua 
entre adultos e crianças, seja em situação formal escolar, seja informal de imersão 
lingüística; 
c) aquisição da escrita, letramento, processos de alfabetização, relação entre a 
fala e a escrita, entre o sujeito e a escrita nesse processo etc. 
2. TEMAS E ABORDAGENS TEÓRICAS SOBRE A AQUISIÇÃO DA LINGUAGEM 
2.1. O velho debate pendular sobre nature (natureza) versus nurture (criação, ambiente). O inato e o 
adquirido. O biológico e o social 
Os estudos sobre processos e mecanismos de aquisição da linguagem tomaram 
um grande impulso a partir dos trabalhos do lingüista Noam Chomsky, no fim da 
década de 1950, em reação ao behaviorismo vigente na época. O quadro científico era 
na época dominado pela corrente behaviorista ou ambientalista, dominante 
exatamente nas teorias de aprendizagem. A aprendizagem da linguagem seria fator de 
exposição ao meio e decorrente de mecanismos comportamentais como reforço, 
estímulo e resposta. Aprender a língua materna não  seria diferente, em essência, da 
aquisição de outras habilidades e comportamentos, como andar de bicicleta, dançar 
etc, já que se trata, ao longo do tempo, do acúmulo de comportamentos verbais. 
Skinner (1957), psicólogo cujo trabalho foi o mais influente no behaviorismo, parte de 
pressupostos tanto metodológicos (como ênfase na observabilidade de manifestações 
comportamentais, externas, mensuráveis, da aprendizagem) quanto teóricoepistemológicos 'como a premissa da inacessibilidade à mente para se estudar o 
conhecimento, postura contrária à mentalista e idealista nas ciências humanas) e 
propõe, então, enquadrar a linguagem (ou "comportamento verbal") na sucessão e 
contingência de mecanismos de estímulo-resposta-reforço, que explicam o condicionamento e que estão na base da estrutura do comportamento. 
Chomsky adota uma postura inatista na consideração do processo por meio do 
qual o ser humano adquire a linguagem. A linguagem, específica da espécie, dotação 
genética e não um conjunto de comportamentos verbais, seria adquirida como 
resultado do desencadear de um dispositivo inato, inscrito na mente. Tornou-se 
famosa esta polêmica criada pela publicação, em 1959, da devastadora resenha, de 
autoria do então jovem Chomsky, do livro Comportamento verbal, de Skinner. Nela, o 
lingüista posiciona-se contra a visão ambientalista de aprendizagem da linguagem. 
Chomsky começa por rejeitar a projeção das evidências skinnerianas, provenientes de 
experimentos laboratoriais com animais, para a linguagem humana, específica da 4 
espécie, resultado de dotação genética e inscrita na mente do sujeito falante. E 
continua argumentando que as estruturas de condicionamento e de aprendizagem, 
segundo as quais um modelo A é reproduzido, pelo aprendiz, por mecanismos de 
contingenciamento ou imitação, como A', nem de longe começa a explicar a 
complexidade e a sofisticação do conhecimento lingüístico (na primeira versão da 
teoria chamado de  competência lingüística)  que tem bases biológicas (porque 
genéticas) e, portanto, universais. Os enunciados produzidos pelo falante e as próprias 
línguas do mundo são manifestações da faculdade da linguagem. Assim, a criança que 
aprende a sua língua nativa é uma imagem a que Chomsky retorna repetidamente, 
desde seus primeiros escritos, de maneira que se torna difícil discriminar sua teoria da 
linguagem de sua visão da aquisição da linguagem. 
O argumento básico de Chomsky é: num tempo bastante curto (mais ou menos 
dos 18 aos 24 meses), a criança, que é exposta normalmente a uma fala precária, 
fragmentada, cheia de frases truncadas ou incompletas, é capaz de dominar um 
conjunto complexo de regras ou princípios básicos que constituem a gramática 
internalizada do falante. Esse argumento, constantemente reafirmado, é chamado de 
"pobreza do estímulo". Um mecanismo ou dispositivo inato de aquisição da linguagem 
(em inglês, LAD, language acquisition'device), que elabora hipóteses lingüísticas sobre 
dados lingüísticos primários (isto é, a língua a que a criança está exposta), gera uma 
gramática específica, que é a gramática da língua nativa da criança, de maneira 
relativamente fácil e com um certo grau de instantaneidade. Isto é, esse mecanismo 
inato faz "desabrochar" o que "já está lá", através da projeção, nos dados do 
ambiente, de um conhecimento lingüístico prévio, sintático por natureza. 
No bojo de modificações e reajustes que a teoria gerativa sofreu num segundo 
momento, introduzindo a chamada Teoria de Princípios e Parâmetros, o argumento da 
"pobreza do estímulo" foi retomado e refraseado com uma atitude francamente 
platonista ante a linguagem. A "pobreza do estímulo", um dos mais importantes 
argumentos em prol do inatismo, vincula-se à metáfora do  problema de Platão,  ao 
qual, segundo o lingüista, filiam-se as questões centrais relativas à linguagem. O 
problema de Platão coloca-se da seguinte maneira:  como é que o ser humano pode 
saber tanto diante de evidências tão passageiras, enganosos e fragmentárias?
Transferindo para a linguagem, essa questão quer dizer que o conhecimento da 
língua é muito maior que sua manifestação. Assim, a linguagem está vinculada a 
mecanismos inatos da espécie humana e comuns aos membros dessa espécie, daí a 
idéia de universais lingüísticos. Esta visão, que coloca a linguagem num domínio 
cognitivo e biológico, admite que o ser humano vem equipado, no estágio inicial, com 
uma Gramática Universal (GU), dotada de princípios  universais pertencentes à 
faculdade da linguagem, e de parâmetros "fixados pela experiência", isto é, 
parâmetros não-marcados que adquirem seu valor (+ ou -) por meio do contacto com a 
língua materna. Essa teoria de aquisição tem sido chamada de "princípios e 
parâmetros" ou "paramétrica". Alguns dos parâmetros que têm sido estudados são: se 
a língua opta por sujeito nulo ou por sujeito preenchido, por objeto nulo ou objeto 
preenchido, pela colocação dos clíticos, pelo tipo  de flexão ou estrutura temática do 
verbo etc. 
A separação estrita entre conhecimento e uso é decorrência direta da 
postulação de conhecimento tácito, prévio, biológico, de cunho lingüístico, in-5 
dependente dos fatores ambientais, culturais, psicológicos ou histórico-sociais 
determinantes da aquisição da língua materna. Oposto ao "problema de Platão" está o 
"problema de Orwell/Freud", apropriado, segundo o lingüista, para questões sociais, 
históricas e políticas, ou para os desdobramentos sócio-histórico-psicanalíticoideológicos do uso da linguagem, que fogem à alçada da teoria lingüística. Este 
"problema de Orwell/Freud" parafraseia-se assim: como pode O ser humano saber tão 
pouco diante de evidências tão ricas e numerosas?
Em suma, no processo de aquisição da linguagem, a criança c exposta a um 
input  (conjunto de sentenças ouvidas no contexto), sendo  o  output  um sistema de 
regras para a linguagem do adulto, a gramática de uma determinada língua.  
1. Numa primeira versão da teoria, postulava-se a existência de uma série de 
regras gramaticais, mais um procedimento de avaliação e descoberta, presentes no 
Dispositivo de Aquisição da Linguagem (LAD); ao confrontá-las com o input, a criança 
escolhe as regras que supostamente fariam parte de sua língua (Chomsky, 1957, 1965). 
Num segundo momento, postula-se que a criança nasce pré-programada com 
princípios (universais) e um conjunto de parâmetros que deverão ser fixados ou 
marcados de acordo com os dados da língua à qual a criança está exposta. A criança 
não escolhe mais as regras, nesta versão de princípios e parâmetros, mas valores 
paramétricos. 
A que tipo de dados ou a que quantidade de dados lingüísticos a criança deve 
ser exposta? Trabalhos recentes (Lightfoot, 1991) afirmam que a criança precisa ser 
exposta a uma quantidade relativamente pequena de linguagem, meramente a algum 
gatilho crucial, como pequenas cláusulas simples, a fim de descobrir que caminho sua 
língua materna tomou. Uma vez descoberto tal caminho, ela já sabe, 
automaticamente, por meio de pré-programação, um bom tanto sobre como 
funcionam as línguas daquele tipo. A aprendizibilidade é, assim, uma questão teórica 
central da teoria paramétrica de aquisição da linguagem. Como é a linguagem 
aprendível, se pode só contar com as migalhas de fala ouvidas pelas crianças, que não 
fornecem pistas suficientes para o estado final da  língua a ser aprendida? Este c 
também chamado de "problema lógico da aquisição da  linguagem":  como, 
logicamente, as crianças adquirem uma língua se não têm informação suficiente para a 
tarefa? A resposta lógica ç que trazem uma enorme quantidade de informações a que 
Chomsky chama de Gramática Universal (GU), que é "uma caracterização destes 
princípios inatos, biologicamente determinados, que constituem o componente da 
mente humana — a faculdade da linguagem". 
Deve ainda ser lembrado que. de acordo com os princípios chomskianos, as 
diferenças entre as línguas do mundo não são assim  tão grandes do ponto de vista 
sintático, gramatical, o que ajuda a explicar o universalismo (Chomsky, 1993). 
Uma outra decorrência do inatismo lingüístico é a modularidade cognitiva da 
aquisição da linguagem: o mecanismo de aquisição da linguagem é específico dela, não 
exibindo interface óbvia com outros componentes cognitivos ou comportamentais. A 
relação entre a língua e outros sistemas cognitivos, como a percepção, a memória e a 
inteligência, é indireta, e a aquisição da linguagem — ou o desencadeamento da 
Gramática Universal junto com a fixação de parâmetros — não depende, 
necessariamente, de outros módulos cognitivos, muito menos de interação social. 6 
As colocações inatistas de Chomsky suscitaram uma série de estudos, a partir 
dos anos 1960, que se concentraram sobretudo na chamada fase sintática, onde a 
prioridade de análise pendeu para o estudo da aquisição da gramática da criança por 
volta do seu segundo ano de vida, quando a criança já começa a produzir enunciados 
de mais de uma palavra. Tais trabalhos foram criticados e contra-evidenciados por 
duas vertentes teóricas que, junto com os trabalhos gerativistas, têm norteado os 
estudos na área. São elas: o cognitivismo construtivista e o interacionismo social, que 
veremos a seguir. 
2.2. O cognitivismo construtivista: Piaget, Vygotsky 
A idéia de que a aquisição e o desenvolvimento da linguagem são derivados do 
desenvolvimento do raciocínio na criança contesta a autonomia do chamado 
mecanismo de aquisição da linguagem ou da GU como domínio específico de 
conhecimento lingüístico. Em outras palavras, a aquisição da linguagem depende do 
desenvolvimento da inteligência na criança. A abordagem chamada de  cognitivismo 
construtivista ou epigenético foi desenvolvida com base nos estudos do epistemólogo 
suíço Jean Piaget, segundo o qual o aparecimento da linguagem se dá na superação do 
estágio sensório-motor, por volta dos 18 meses. Neste estágio de desenvolvimento 
cognitivo, numa espécie de "revolução coperniciana", usando as palavras do próprio 
Piaget (1979), dá-se o desenvolvimento da função simbólica, por meio da qual um 
significante (ou um sinal) pode representar um objeto significado, além do desenvolvimento da representação, pela qual a experiência pode ser armazenada e recuperada. 
Essas duas funções estão estreitamente ligadas a outros três processos que ocorrem 
concomitantemente e que colaboram para a superação  do que Piaget chama de 
"egocentrismo radical", presente no período sensório-motor, segundo o qual existe 
"uma indiferenciação entre sujeito e objeto ao ponto que o primeiro não se conhece 
nem mesmo como fonte de suas ações". Em outras palavras, o autor fala aqui da 
indiferenciação cognitiva entre o sujeito e o mundo ou pessoas que o cercam. Estes 
três processos são os relacionados a seguir: 
a) o da descentralização das ações em relação ao corpo próprio, isto é, entre 
sujeito e objeto (ou entre "eu" e "o outro" ou "eu" e "o mundo"); o sujeito começa a se 
conhecer como fonte ou senhor de seus movimentos; 
b) o da coordenação gradual das ações: "em lugar de continuar cada uma a 
formar um pequeno todo em si mesmo", elas passam a se, coordenar para constituir 
uma conexão entre meios e fins; 
c) o da permanência do objeto, segundo o qual o objeto permanece o mesmo 
e igual a si próprio mesmo quando não está presente no espaço perceptual da criança. 
Por meio de (a), (b) e (c), é possível o uso efetivo do símbolo, da representação 
de um sinal por outro, de exercer o princípio de arbitrariedade do símbolo. A criança 
passa, por exemplo, a ser capaz de usar uma caixa de fósforo para "fazer de conta" 
(representar) que é um caminhãozinho. Assim também, para a criança, um objeto, se 
deslocado do seu campo perceptual, continua existindo (isto é, o objeto torna-se 
permanente). Com a linguagem, o jogo simbólico, a imagem mental, as sucessivas 
coordenações entre as ações e entre estas e o sujeito, surge a possibilidade de 
internalizar e conceptualizar as ações: "... com mais capacidade de se deslocar de A 
para B, o sujeito adquire o poder de representar a si mesmo esse movimento AB e de 7 
evocar pelo pensamento outros deslocamentos". 
Quando essas conquistas cognitivas se unem, na superação da inteligência 
sensória e motora, a caminho da inteligência pré-operatória de fases posteriores, 
surge a possibilidade de a criança adotar os símbolos públicos da comunidade mais 
ampla em lugar de seus significantes pessoais: em outras palavras, a linguagem se 
torna possível (já que a linguagem é entendida, por Piaget, como um sistema simbólico 
de representações), assim como outros aspectos da função simbólica geral, como é o 
desenhar. 
Em contraposição ao modelo inatista, a aquisição é  vista como resultado da 
interação entre o ambiente e o organismo, através de assimilações e acomodações, 
responsáveis pelo desenvolvimento da inteligência em geral, e não como resultado do 
desencadear de um módulo — ou um órgão — específico para a linguagem. Daí se diz 
que a visão de Piaget sobre a linguagem é não-modularista. Assim também, a visão 
behaviorista é rechaçada, com a crença de que as crianças não esperam passivamente 
que o conhecimento de qualquer espécie lhes seja transmitido. As pesquisas de 
inspiração piagetiana floresceram nas décadas de 1970 e 80. As críticas ao modelo 
piagetiano, que criaram força também neste período, baseiam-se na interpretação de 
que Piaget avaliou mal e subestimou o papel do social e das outras pessoas no 
desenvolvimento da criança e que um modelo interativo social se fazia necessário para 
explicar o desenvolvimento nos primeiros dois anos, modelo esse que desse conta de 
como a criança e seu interlocutor exploram os fenômenos físicos e sociais. 
Aí é que surgiram nas elaborações teóricas ocidentais, as propostas de 
Vygotsky para melhor dar conta do alcance social da aquisição da linguagem. Psicólogo 
soviético, morreu prematuramente em 1934, mas o grosso de sua obra só começou a 
ser amplamente traduzido para o francês e para o inglês a partir dos anos 1960. Sua 
grande influência nos estudos de aquisição da linguagem começa efetivamente nos 
anos 1970, no bojo dos questionamentos ao inatismo  chomskiano e como uma 
alternativa ao cognitivismo construtivista piagetiano. De orientação construtivista 
como Piaget, explica, porém, o desenvolvimento da linguagem (e do pensamento) 
como tendo origens sociais, externas, nas trocas comunicativas entre a criança e o 
adulto. Tais estruturas construídas socialmente, "externamente", sofreriam, com o 
tempo (mais ou menos por volta de 2 anos de idade), um movimento de interiorização 
e de representação mental do que antes era social e internalizado. 
Vygotsky (1984) parte do princípio de que os estudiosos separam o estudo da 
origem e desenvolvimento da fala do estudo da origem do pensamento prático na 
criança. Em outras palavras, o estudo do uso dos instrumentos tem sido isolado do uso 
dos signos. Vygotsky propõe, ao contrário, que fala e pensamento prático devem ser 
estudados sob um mesmo prisma e atribui à atividade simbólica, viabilizada pela fala, 
uma função organizadora do pensamento: com a ajuda  da tala, a criança começa a 
controlar o ambiente e o próprio comportamento. O poderoso instrumento da 
linguagem é trazido pelo que chama de internalização da ação e do diálogo. Vygotsky 
entende o processo de internalização como uma reconstrução interna de uma 
operação externa, mas, diferentemente de Piaget, para a internalização de uma 
operação deve concorrer a atividade mediada pelo outro, já que o sucesso da 
internalização vai depender da reação de outras pessoas. Assim é que, entre criança e 
ação com o mundo, existe a mediação através do outro. São as seguintes as 8 
transformações que ocorrem no processo de internalização: 
a) uma operação que, inicialmente, representa uma atividade externa é 
reconstruída e começa a ocorrer internamente, daí a importância da atividade 
simbólica através do uso de signos; 
b) um processo interpessoal é transformado num processo intrapessoal: as 
funções no desenvolvimento da criança aparecem primeiro no nível social e, depois, 
no individual. Em outras palavras, primeiro entre pessoas (de maneira interpsicológica) 
e, depois, no interior da criança (intrapsicológica). Assim, segundo Vygotsky, todas as 
funções superiores (memória lógica, formação de conceitos, entre outras) originam-se 
das relações reais entre as pessoas; 
c) a transformação de um processo interpessoal num processo intrapessoal é 
resultado de uma longa série de eventos ocorridos ao longo do desenvolvimento, isto 
é. a história das relações reais entre as pessoas são constitutivas dos processos de 
internalização. 
Segundo o autor, a internalização das atividades socialmente enraizadas e 
historicamente desenvolvidas é a principal característica da psicologia humana. 
Os trabalhos de inspiração vygotskiana entendem a aquisição da linguagem 
como um processo pelo qual a criança se firma como  sujeito da linguagem (e não 
como aprendiz passivo) e pelo qual constrói ao mesmo tempo seu conhecimento do 
mundo, passando pelo outro. Esses trabalhos têm sido considerados parte do 
chamado "interacionismo social", que não se esgota nos trabalhos vygotskianos, como 
veremos a seguir. 
2.3. 0 interacionismo social 
Numa visão que se distancia em graus variados tanto do cognitivismo 
piagetiano quanto do inatismo chomskiano, está o interacionismo dito "social". 
Segundo esta postura, passam a ser levados em conta fatores sociais, comunicativos e 
culturais para a aquisição da linguagem. Assim, a interação social e a troca 
comunicativa entre a criança e seus interlocutores são vistas como pré-requisito básico 
no desenvolvimento lingüístico. Segundo essa abordagem, rituais comunicativos pré-
verbais preparam e precedem a construção da linguagem pela criança. As 
características da fala do adulto (ou das crianças  mais velhas) são estudadas e 
consideradas fundamentais para o desenvolvimento da linguagem na criança. Alguns 
estudos demonstram como esquemas de ação e atenção  partilhadas pela criança e 
pelo adulto interlocutor-básico precedem categorias lingüísticas. 
A fala a que a criança está exposta  (input)  é vista como importante fator de 
aprendizagem da linguagem. A este respeito, uma das questões que se tem colocado é 
se o bebê será atingido por toda e qualquer amostra lingüística ou manifestações 
lingüísticas ao seu redor ou se as amostras que irão ter influência na aquisição têm um 
caráter seletivo. Embora essa questão não tenha ainda tido uma resposta definitiva, as 
pesquisas têm apontado para a segunda alternativa:  a criança é afetada pela fala 
dirigida a ela. 
A afirmação inicial de Chomsky sobre o  input  degradado, composto de frases 
truncadas e agramaticais, foi desafiada por pesquisas subseqüentes, abundantes nos 
anos 1970 e 80, que examinaram dados naturalísticos da fala adulta dirigida à criança 9 
(Snow, 1978, Bullowa, 1979). Tais estudos apontam, isso sim. para modificações que a 
fala adulta sofre quando dirigida à criança, em contraposição à dirigida ao adulto e a 
crianças mais velhas, além de características específicas de comunicação entre adultos 
e bebês que nada tinham de "agramatical" propriamente, como a hipótese de 
"pobreza do estímulo" sugere. Vejamos algumas das características mais reportadas na 
literatura sobre tais "modificações" que a fala dirigida à criança sofre, cm comparação 
com a fala dirigida a crianças mais velhas e a adultos. Trata-se de modificações 
fonológicas, morfológicas, sintáticas, semânticas e pragmáticas: 
a) entonação "exagerada", reduplicações de sílabas ("au-au", "papai", "dodói"), 
velocidade de fala reduzida, qualidades de voz diferenciadas, tendendo para o 
"falsetto": 
b) frases mais curtas e menos complexas: expansões sintáticas a partir de uma 
palavra dita pela criança ou "tradução" de gesto feito por ela; 
c) referência espacial e temporal voltada para o momento da enunciação; 
d) palavras de conteúdo lexical mais corriqueiro, mais familiares e freqüentes 
na rotina cotidiana da criança; 
e) paráfrases, repetições ou retomadas das emissões da criança. 
Desde o nascimento, o bebê é mergulhado num universo significativo por seus 
interlocutores básicos, que atribuem significado e  intenção às suas emissões vocais, 
gestos, direção do olhar. Até mesmo os diversos tipos de choro são "interpretados", 
"significados" e "classificados" pelo adulto interlocutor. O bebê é assim, visto como 
potencial parceiro comunicativo do adulto, que empreende uma "sintonia tina" com as 
manifestações potencialmente comunicativas e significativas da criança, qualquer que 
seja seu conteúdo expressivo (gesto, voz, balbucios, palavras ou frases). Há um ajuste 
mútuo nas conversações entre adulto e criança, de maneira que as vocalizações 
infantis não caem num vácuo comunicativo. Segundo Ochs & Schieffelin, os adultos 
"respondem às ações de bebês muito pequenos como se fossem intencionalmente 
direcionadas a eles" e "esta prática de tratar o bebê como um autor corresponde a 
tratar o bebê como um destinatário, pois os dois papéis combinados instituem o bebê 
como um parceiro conversacional". 
Essas características foram encontradas numa variedade bastante grande de 
comunidades culturais e lingüísticas, de tal modo que a conclusão imediata é que são 
características universais. A suposta universalidade da fala modificada adulta dirigida à 
criança desencadeou reações opostas. Citarei duas delas. 
A primeira recrudesce o inatismo. Relaciona-se com a retomada, nos anos 90. 
de interpretações que nos anos 1970/80 tinham caráter cultural-comunicativo, mas, 
desta vez, com roupagem inatista. Assim é que propostas recentes têm visto a 
universalidade de modulações de voz da chamada entonação "afetiva" (negação, 
conforto, privação, atenção) como manifestações de comportamentos pré-adaptativos 
da criança, numa visão declaradamente neodarwinista. Segundo esta visão, a criança 
vem pré-programada, devido a processos de seleção natural, a reagir às curvas 
entonacionais próprias de situações de conforto, desconforto, privação etc. Tais 
modulações propiciariam a saliência prosódica de constituintes gramaticais que 
seriam, assim, desencadeados (Fernald, 1993). 10 
A segunda reação desafia a visão universalista do tipo de interação adulto-bebê 
e explora diferenças culturais de interação e de transmissão cultural. Trabalhos de 
campo realizados com comunidades outras que não a branca, classe média, ocidental, 
mostram diferentes características na interação adulto-bebê que as até então 
reportadas na literatura. Os trabalhos mais famosos nesta direção são com os maias do 
grupo quiché da Guatemala (Pye, 1992), com os kaluli, povo de Papua-Nova Guiné 
(Schieffelin. 1990), e com os samoanos da Samoa Ocidental, na Polinésia (Ochs, 1988). 
Nessas comunidades, a interação verbal entre crianças e adultos é mínima, isto porque 
a criança não tem o papel de destinatário até que consiga pronunciar palavras 
reconhecíveis pela língua. As vocalizações do bebê são ignoradas pelos adultos e não 
há intenção atribuída a elas. Segundo Ochs & Schieffelin (1997), os kaluli adultos 
ficaram surpresos com o fato de os pais americanos  (presentes na comunidade) 
utilizarem baby talk (fala infantilizada) para as crianças pequenas e se espantaram com 
o fato de as crianças americanas conseguirem aprender adequadamente uma língua 
sendo expostas a amostras "deturpadas" de fala segundo a visão de sua cultura. 
Dentro ainda de uma postura oposta ao universalismo da fala dirigida à criança, 
a proposta neodarwinista, exposta anteriormente, também tem sido questionada 
Cavalcante (1999), replicando os experimentos de Femald em duas díades brasileiras, 
também contesta a universalidade de marcas vocais interacionais e chega à conclusão 
de que nem as situações de "afetividade" são sempre assim tão marcadas como a que 
Fernald encontrou em seus sujeitos interagindo com  os respectivos adultos, nem as 
modulações de altura, consideradas foneticamente recortadas e universais por 
Fernald, dos sujeitos brasileiros analisados seguem o mesmo padrão de contorno 
entonacional mostrado pela autora americana. Cavalcante chega igualmente à 
conclusão de que traços culturais e discursivos da interação adulto-criança contribuem 
para marcar lingüisticamente as interações entre mãe e bebê. 
A meio caminho entre propostas cognitivistas construtivistas (desenvolvimento 
da inteligência — e da linguagem — pela interação entre organismo e ambiente) e 
interacionistas sociais, Bruner (1975) pode nos fornecer um exemplo sobre como a 
aquisição do sistema de transitividade pode decorrer da construção e internalização de 
estruturas lingüísticas a partir da interação do bebê com o outro e com o mundo físico. 
A partir dos 6 meses de idade, a criança e o adulto engajam-se cm jogos 
(empilhar blocos, esconder o rosto atrás de um obstáculo e depois mostrar a face etc.) 
que patenteiam instâncias de atenção partilhada e ação conjunta. Tais esquemas 
interacionais formam o espaço da partilha com o outro, no qual a criança vai 
desenvolver determinadas funções, quer lingüísticas, quer comunicativas, primeiro em 
nível gestual e depois em nível verbal. Assim, pode-se traçar uma trajetória entre a 
ação conjunta adulto-bebê e o estabelecimento de papéis no discurso e no diálogo 
(pessoas gramaticais) mais ou menos da seguinte maneira: nos jogos referidos, o 
adulto instaura a brincadeira enquanto a criança observa (esconder o rosto, por 
exemplo). Assim, o adulto toma o papel do "agente" ou tomador do turno ("eu"), ao 
passo que a criança funciona como "paciente" e interlocutor ("tu"). Numa etapa 
posterior, a criança vai reverter os papéis: tomar a iniciativa de começar o jogo ou a 
etapa do jogo, isto é, tomar o papel do "falante", enquanto o adulto será o espectador, 
o "interlocutor". Esses esquemas gestuais, de início, serão lingüísticos quando a 
criança tiver meios expressivos para exprimir as funções. Essas funções primárias tem. 11 
além disso, um papel na determinação das funções gramaticais de 
agente/ação/paciente, responsáveis, segundo modelos funcionalistas de gramática, 
pelos sistemas de transitividade nas línguas. Nos jogos descritos, a criança aprende 
uma espécie de embrião, na ação e interação, em fases pré-verbais, do que mais tarde 
emergirá como marcação lingüística. É primeiro "paciente" ou "objeto da ação" praticada pelo adulto, que é, neste momento, "agente"  da ação instaurada por ele 
próprio. Numa etapa posterior, a estrutura se reverte, com a partilha de papéis: a 
criança aprende a ser "agente" da ação conjunta, isto é, da qual participam ela e o 
adulto interlocutor básico. 
A atenção partilhada, por sua vez, desenvolverá conceitos como tópico/ 
comentário, uma das maneiras de expressar sujeito/predicado. O adulto, numa fase 
pré-verbal, focaliza um ponto de atenção qualquer, espera que a criança acompanhe 
seu foco de atenção e comenta sobre ele. Isto é, a criança participa de esquemas em 
que se focaliza ou topicaliza para depois se comentar ou predicar.  Já noções de ação 
completa ou realizada  vs.  ação não-completada que serão responsáveis pelas 
marcações de tempo e de aspecto nas línguas, seriam igualmente instauradas em 
esquemas interativos. Os pontos salientes de um evento são sempre marcados 
lingüisticamente (pelo adulto) ou vocal ou gestualmente (tanto pelo adulto como pela 
criança). O que é gesto ou balbucio da criança numa situação de troca comunicativa 
será verbal em etapas posteriores, por meio, neste caso de flexão verbal de tempo e 
uso de partículas temporais ou aspectuais. Um exemplo corriqueiro é "cai/caiu", que, 
tanto na fala do adulto, quanto na da criança observando ações ou eventos ou 
realizando ações, indica ação incompleta (ou em progresso) ação completada ou 
presente  vs.  futuro. As expressões "cai'"caiu", quando instauradas, são "coladas" à 
ação tanto realizada pela criança quanto pelo interlocutor e posteriormente se integram ao sistema temporal e aspectual do verbo na língua-alvo. 
Uma das vertentes do interacionísmo social é a que  se convencionou chamar 
de "sociointeracionismo". Propostas sociointeracionistas afirmam que a linguagem é 
atividade constitutiva do conhecimento do mundo pela criança. A linguagem é o 
espaço em que a criança se constrói como sujeito; o conhecimento do mundo e do 
outro é, na linguagem, segmentado e incorporado. Linguagem e conhecimento do 
mundo estão intimamente relacionados e os dois passam pela mediação do outro, do 
interlocutor. Os objetos do mundo físico, os papéis no diálogo e as próprias categorias 
lingüísticas não existem a priori (isto é, não estão a priori segmentados, conhecidos ou 
interpretados), mas se instauram através da interação dialógica entre a criança e seu 
interlocutor básico. Esta interação vai proporcionar, ao mesmo tempo, a criação da 
criança e dó próprio interlocutor como sujeitos do diálogo, a segmentação da ação e 
dos objetos do mundo físico sobre os quais a criança vai operar, e a própria construção 
da linguagem, que por si é um objeto sobre o qual a criança também vai operar. Essa 
proposta não se centraliza sobre o produto lingüístico (o que a criança, de um lado, e a 
mãe, de outro e separadamente, dizem), mas no processo comum aos dois 
interlocutores. Segundo Lemos (1982), o objeto de estudo que se toma é a linguagem 
enquanto atividade do sujeito. Neste caso, enfrenta-se a indeterminação, a mudança e 
a heterogeneidade deste objeto. Os processos dialógicos são revalorizados. Há três 
processos básicos no diálogo: especularidade (identificação entre os sinais dos dois 
interlocutores), complementaridade (incorporação de parte ou de todo o enunciado, 12 
ou gesto, do interlocutor e complementação criativa) e reversibilidade de papéis 
(assumir o papel do outro e instituir o outro como interlocutor). 
2.3.1. Facetas atuais do sociointeracionismo 
Dando continuidade às suas indagações sobre como, através da interação com 
o adulto, a criança chegaria à língua. Lemos (1992, 1995, 1998, 1999) deu uma direção 
alternativa ao sociointeracionismo presente nos seus escritos até os anos 1980. 
preferindo, atualmente, chamar sua postura simplesmente de "interacionista". 
Inspirada em leituras de Saussure e do psicanalista Lacan. estuda as relações do sujeito 
com a língua e questiona as noções de desenvolvimento e conhecimento lingüístico 
que têm sido a base das teorias psicolingüísticas, psicológicas e lingüísticas. Posicionase contra a noção de conhecimento própria do "sujeito psicológico", que está presente 
nas noções de desenvolvimento, e de sujeito onisciente, e contra a noção de 
representação mental, que é a fonte e o alvo da aquisição do conhecimento lingüístico. 
Assim, recusa-se a ver a aquisição da linguagem como a aquisição ou construção de 
conhecimento da língua, concepção consagrada pela expressão "desenvolvimento 
lingüístico". A autora não mais assume que. num determinado momento, o 
conhecimento da língua permite ã criança passai de  interpretado a intérprete, da 
incorporação da tala do outro à assunção da própria fala, tornando-se, assim, um 
falante em pleno controle de sua atividade lingüística. A presença de fragmentos da 
fala do outro na fala da criança, além de autocorreções e hesitações, não autoriza, segundo a autora, que se fale em "conhecimento pleno  da língua" nem de um estágio 
estável final. Passa, então, de uma visão diacrônica para uma visão estrutural. Em vez 
de "construção" e "desenvolvimento", entende que a  criança é colocada numa 
estrutura em que comparece o outro, como instância  representativa da língua, a 
própria língua em seu funcionamento e a criança como sujeito falante. Essa estrutura é 
a mesma em que se move o adulto, daí que não há propriamente "desenvolvimento", 
nem "construção". O que identifica as mudanças no processo de aquisição são as 
diferentes posições da criança nesta estrutura, ou melhor, as diferentes relações do 
sujeito com a língua, em que o pólo dominante da estrutura pode ser o outro, a língua 
ou o próprio sujeito. 
O leitor é agora convidado a examinar uma ilustração da polêmica  inato vs. 
adquirido ou natureza vs. ambiente: a questão popular e recorrente do período crítico 
de aquisição da língua materna e de segunda língua (L2). Vamos a ela. 
3. A QUESTÃO DO "PERÍODO CRÍTICO"
Todos sabemos como é difícil (tentar) dominar uma segunda língua em idade 
adulta, ainda mais em situação formal, escolar. Por mais brilhante e esforçado que seja 
o aprendiz, mesmo que a proficiência final seja bastante satisfatória, tanto em termos 
gramaticais quanto lexicais, e suficiente para atingir plenos objetivos de comunicação 
numa segunda língua, sempre ficam, na fala do aprendiz, certas construções 
gramaticais mal-ajambradas, erros fossilizados, ou, mais certamente, um sotaque 
"estranho" aos ouvidos dos falantes nativos. Segundo Pinker (1994), o sucesso total 
em aprender uma segunda língua em idade adulta, ainda mais em situação de sala de 
aula, existe, mas é raro e depende de "puro talento". 
Lenneberg (1967) buscou bases biológicas para argumentar em favor do 13 
"período crítico" para a aquisição da linguagem. Eis suas palavras: 
Entre dois e três anos de idade, a linguagem emerge através da interação entre 
maturação e aprendizado pré-programado. Entre os três anos de idade e a adolescência, a possibilidade de aquisição primária da linguagem continua a ser boa; o 
indivíduo parece ser mais sensível a estímulos durante este período e preservar uma 
certa flexibilidade inata para a organização de funções cerebrais para levar a cabo a 
complexa integração de subprocessos necessários à adequada elaboração da fala e da 
linguagem. Depois da puberdade, a capacidade de auto-organização e ajuste às 
demandas psicológicas do comportamento verbal declinam rapidamente. O cérebro 
comporta-se como se tivesse se fixado daquela maneira e as habilidades primárias e 
básicas não adquiridas até então geralmente permanecem deficientes até o fim da 
vida. 
Pinker (1994) afirma que a aquisição de uma linguagem normal é garantida até 
a idade de 6 anos, é comprometida entre 6 até pouco depois da puberdade, e é rara 
daí para a frente. Este autor chega a especular que o período crítico se explica por 
mudanças maturacionais no cérebro, tais como o declínio da taxa de metabolismo e do 
número de neurônios durante a idade escolar e da diminuição do metabolismo e do 
número de sinapses cerebrais na adolescência. 
No entanto, nem mesmo essas justificativas biológicas têm sido explicações 
finais e convincentes para o fenômeno do "período crítico" de aquisição. Aitchinson 
(1989) aponta para a insuficiência explicativa dos  argumentos arrolados em favor 
desta hipótese. Pelo menos quatro deles têm sido citados: 
a) casos de estudos de indivíduos que foram isolados de qualquer convívio 
social ou troca lingüística e adquiriram a linguagem tardiamente; 
b) o desenvolvimento da fala de crianças com síndrome de Down; 
c) a suposta sincronia do período crítico com a lateralização hemisférica; 
d) dificuldades de aquisição de segunda língua depois da adolescência. 
Vejamos mais detalhadamente cada um deles. 
Em relação às crianças isoladas lingüística e socialmente, os casos mais 
conhecidos, reportados neste século, são de Isabelle, Genie e Chelsea. Isabelle era a 
filha ilegítima de uma mulher surda e cérebro-lesada com a qual passava a maior parte 
do tempo, ambas enclausuradas num quarto escuro, na casa de seu avô, no interior do 
Estado de Ohio. Quando mãe e filha escaparam da prisão domiciliar nos anos 1930, 
Isabelle tinha 6 anos e meio e não falava; apenas emitia sons guturais. Mas, uma vez 
resgatada para o convívio social, seu progresso na  aquisição da linguagem foi 
fantástico: em dois anos e meio, sua linguagem mal  se distinguia da de crianças da 
mesma idade que tiveram condições normais de desenvolvimento. Ela dizia, por 
exemplo: "What did Miss Mason say when you told her I cleaned my classroom?" (O 
que a senhorita Mason disse quando você lhe contou  que eu limpei minha sala de 
aula?) Genie, entretanto, não teve a mesma sorte. Descoberta em 1970, com quase 14 
anos, tinha vivido toda sua vida em condições sub-humanas. Confinada a um cubículo 
desde a idade de 20 meses e agredida fisicamente pelo pai quando emitisse qualquer 
som, não falava nada. Apesar de, depois de resgatada, ter aprendido a falar de modo 
rudimentar, progredia mais lentamente do que uma criança normal. Eis um exemplo 14 
do que ela conseguia dizer, depois de anos de aprendizado: "Mike paint" (Mike pintar); 
"Applesauce buy store" (Molho de maçã comprar loja); "Neal come happy. Neal not 
come sad" (Neal vir contente. Neal não vir triste). Genie demonstrava, porém, grande 
habilidade em memorizar vocabulário. No entanto, memorizar listas de itens lexicais 
não é evidência de saber falar uma língua. O caso mais recente foi o de Chelsea, 
deficiente auditiva, que fora incorretamente diagnosticada como mentalmente 
retardada e por isso criada numa cidade remota do norte da Califórnia. Aos 31 anos de 
idade, ela foi encaminhada para um neurologista, cuja primeira providência foi instalar 
um aparelho de audição, que fez melhorar muito sua capacidade auditiva. Foi só então 
que Chelsea começou a aprender sua língua materna,  sob tratamento intensivo com 
uma equipe especializada. Ela tem um vocabulário razoável, lê, escreve, comunica-se e 
trabalha. Sua linguagem, porém, ficou "agramatical". Eis alguns exemplos: "The small a 
the hat" (O pequeno um o chapéu); "Banana lhe eat"  (Banana a come). Aitchinson 
(1989) ressalta que tais casos, além de isolados, devem ser tomados com cautela 
quanto a representarem evidência cabal em prol da existência de um período crítico 
de aquisição da linguagem. E possível, lembra o autor, que a extrema privação física, 
comunicativa e emocional de Genie tenha propiciado  um certo retardo mental: seu 
hemisfério esquerdo é levemente atrofiado. Genie c Chelsea têm. portanto, problemas 
não-língüísticos que podem explicar, pelo menos parcialmente, sua linguagem 
rudimentar. 
Em relação ao segundo argumento, é corrente na literatura a afirmação de que 
as crianças portadoras de síndrome de Down e de Williams seguem as mesmas trilhas 
na aquisição e desenvolvimento da linguagem que crianças não-portadoras desta 
deficiência, mas muito mais lentamente. O consenso, até pouco tempo atrás, era de 
que estas pessoas nunca conseguem alcançar a criança normal porque sua capacidade 
aquisicional diminui bastante depois da puberdade.  Mais recentemente, esta 
explicação tem sido contestada pelo fato de que há grandes diferenças individuais no 
desenvolvimento lingüístico de portadores da síndrome de Down (Camargo & Scarpa, 
1996), de tal maneira que há desde crianças que param num estágio estável de 
aquisição bem antes da puberdade até jovens que continuam seu processo de 
aprendizagem tanto de diferentes modalidades discursivas, como o desenvolvimento 
de processos bem criativos e autônomos de escrita. 
Já em relação ao terceiro ponto, até pouco tempo atrás, achava-se que o 
processo de lateralização cerebral ocorria aproximadamente dos 2 aos 14 anos de 
idade — período este estipulado como coincidente com o "período crítico" de 
aquisição da linguagem. Pesquisas neurolingüísticas mais recentes, porém, mostram, 
de um lado, que a lateralização começa na criança já a partir de alguns meses de vida. 
Assim, como não há evidências, em relação a este fenômeno, de um súbito começo do 
período crítico por volta dos dois anos, também não há evidências cabais de um súbito 
cessamento deste mesmo fenômeno depois da adolescência. Por outro lado. há cada 
vez mais evidências que contestam a especialização hemisférica compartimentada da 
linguagem. 
Por último, um argumento contencioso tem sido a contraposição entre o 
bilingüismo infantil, o bilingüismo sucessivo na infância ou adolescência e a aquisição 
de segunda língua na idade adulta. De acordo com interpretações inatistas, o que pode 
explicar a dificuldade do último em contraposição à facilidade e naturalidade dos dois 15 
primeiros seria o acesso — ou a falta dele — á Gramática Universal por parte do 
aprendiz. Essa discussão tem servido de laboratório para teorias de aquisição. Apesar 
de haver discordâncias mesmo entre os adeptos da teoria gerativa, uma interpretação 
mais ou menos comum é que. nos dois primeiros casos, a GU está disponível e dela 
desenvolvem-se duas ou mais línguas. Já a disponibilidade à Gramática Universal não é 
tão óbvia em casos de aquisição de segunda língua por adultos. Segundo Meisel 
(1993), a aquisição de segunda língua depois da adolescência não é mais função de 
Gramática Universal, mas é um processo cognitivo, de aprendizagem de habilidades. 
Daí se explicam as fossilizações e julgamentos limitados de gramaticalidade. 
No entanto, explicações não-gerativistas desafiam esta explicação. A dificuldade de aquisição de segunda língua depois da adolescência tem sido revista e 
relativizada. Argumentos interacionistas são levantados com relação às diferenças 
entre a aquisição da língua materna ou estrangeira  na infância e depois da 
adolescência. Contemplam diferentes fatores interativos e socioculturais de aquisição 
nas duas situações, o que explicaria a extrema diferença individual tanto no processo 
de aquisição de L2 em idade adulta, quanto no alvo a ser atingido: o grau de domínio 
do alvo pretendido é muito variado. Fatores interativos também contemplam as 
modificações e ajustes da fala simplificada, dirigida ao falante não-nativo da língua. 
Este tipo de fala  (foreigner talk)  é igualmente muito variado e de modo algum 
semelhante aos ajustes da fala dirigida à criança.  Mais recentemente, as diferentes 
relações do sujeito com a língua na aquisição da língua materna e na aquisição de 
segunda língua ou língua estrangeira também têm sido invocadas como explicação 
para os casos em questão. 
4. ESTÁGIOS DE DESENVOLVIMENTO DA LINGUAGEM 
Antes de qualquer coisa, c preciso que se diga que  o conceito de estágio é 
dinâmico e não estático, como aponta Perroni (1994). A autora afirma que a sucessão 
de estágios não se dá linearmente, e, para descrevê-la, a "metáfora da espiral (é) mais 
apropriada (...) que a dos degraus de uma longa escada. É um conceito 
intrinsecamente ligado ao de desenvolvimento; assim, os estágios "não são pedaços 
justapostos uns após os outros, mas cada um se enraiza no outro, precedente, e se 
prolonga no seguinte". 
Dito isso, o que segue é uma breve exposição sobre  os estágios de desenvolvimento lingüístico por que passa a criança pré-escolar. 
Segundo Bates & Goodman (1997), a trajetória do desenvolvimento da 
linguagem parece ser, com algumas especificidades. universal e contínua. As crianças 
começam com balbucio, primeiro com vogais (cerca de 3 a 4 meses, em média), depois 
com combinações de vogais e consoantes de complexidade crescente (geralmente 
entre 6 e 12 meses). As primeiras palavras emergem entre 10 e 12 meses, em média, 
embora a compreensão de palavras possa começar algumas semanas antes. Depois 
disso, as crianças passam várias semanas ou meses produzindo enunciados de uma 
palavra. No começo, a taxa de crescimento de seu vocabulário é reduzida, mas há um 
súbito acréscimo nela mais ou menos entre 16 e 20 meses. As primeiras combinações 
de palavras geralmente aparecem entre 18 e 20 meses e. no começo, tendem a ser 
telegráficas. Lá pelos 24 a 30 meses, há outra espécie de explosão vocabular e aos 3 ou 
3 anos e meio, a maioria das crianças normais dominou as estruturas sintáticas e 16 
morfológicas de suas línguas maternas. 
O quadro anterior seria perfeito se não fosse tão polêmico e tão cheio de 
contra-exemplos, como as próprias autoras alertam.  Para efeito deste texto, porém, 
vou limitar-me a apontar alguns aspectos do desenvolvimento da linguagem na 
criança, sobretudo baseada num prisma sociointeracionista, que pode acrescentar 
pelo menos certas nuances no quadro delineado. 
Desde que nasce, a criança já é inserida num mundo simbólico, em que a fala 
do outro a interpreta e lhe imprime significado. Por outro lado, segundo alguns 
trabalhos, com alguns dias de vida, a criança tem uma reação positiva aos sons da fala, 
que lhe são confortadores e gratificantes. A partir de algumas semanas de vida, a 
criança já consegue discriminar a fala de outros sons, rítmicos ou não. Com 3, 4 meses 
de idade, os bebês começam a balbuciar seqüências de sons que se aproximam da fala 
humana. A freqüência do balbucio aumenta e este começa a ser cada vez mais 
padronizado até cerca de 10 meses. O ritmo, a entonação, a intensidade, a duração da 
fala, que no início são assistemáticos, começam a ser recorrentes e estruturados. As 
sílabas começam a se estruturar (discriminação entre C e V) e se repetem 
(reduplicação). 
Aparentemente, os sons que a criança balbucia no começo são universais: os 
sons do balbucio inicial não são específicos de sua língua materna. As crianças surdas 
conseguem balbuciar nesta fase, embora, depois disso, não acompanhem o 
desenvolvimento normal da criança ouvinte. Conforme o balbucio se padroniza, antes 
do aparecimento das primeiras palavras, a seqüência e o acervo de sons passam a se 
assemelhar mais às características fonéticas da língua materna. Os elementos 
prosódicos, como ritmo e entonação, são bastante salientes tanto na fala da criança 
quanto na percepção que a criança tem da fala do adulto. São recursos expressivos 
muito importantes, na falta de recursos léxico-gramaticais do adulto. Vários trabalhos 
mostram o ajuste mútuo entre adulto e criança nesta fase e o papel fundamental que 
esses elementos prosódicos aí representam. 
Alguns trabalhos apontam para os processos dialógicos que se instauram já 
nesta fase. A contribuição da criança é gestual e vocal; a do adulto, gestual e 
lingüística, através da ação e atenção partilhadas. Os estudiosos adeptos desta visão 
afirmam que o adulto interpreta primeiro os gestos  da criança, depois suas 
manifestações vocais, inclusive imprimindo-lhes intenção. Dessa maneira, a fala da 
criança se enquadra numa interpretação dada pela fala do adulto através de seus 
gestos e sons vocais e o próprio adulto se vê "interpretado" pela criança. 
Um rápido lançar de olhos aos dados de uma interação verbal entre adulto e 
criança nesta fase mostra os processos de especularidade e complementaridade que 
perpassam as emissões de ambos os interlocutores. Exemplo: 
(1) A criança estende a mão para um brinquedo e vocaliza algo; a mãe 
imediatamente interpreta o gesto e a voz da criança e responde com algo como: O auau! (nomeando)... K o au-au que você quer? (enquadrando o turno da criança em 
algum significado ou numa cadeia de signos lingüísticos). 
Isto é, a mãe parafraseia a suposta intenção da criança, por um processo de 
especularidade e complementa a paráfrase, expandindo seu enunciado. No fim do 17 
período do balbucio, começam a aparecer na fala da  criança as primeiras palavras 
reconhecíveis como tais pelo adulto. Para algumas crianças, o balbucio cessa quando 
as primeiras palavras aparecem, mas outras crianças continuam a produzir seqüências 
balbuciadas junto com as palavras. 
A produção das primeiras palavras e frases (incorporadas como um bloco do 
discurso do interlocutor básico) mostra indeterminação semiótica (o mesmo 
significado pode ser veiculado por um número bastante grande e variado de sinais), 
fonética (a variação fonética do sinal c grande) c categoria! (o mesmo significado pode 
ser expresso por uma boa variedade do que, na língua adulta, pertenceria a categorias 
diversas). O que também se observa, na transição de enunciados de uma ou mais 
palavras, é a não-segmentabilidade de seqüências de sons em palavras. Muitas vezes, 
frases inteiras são incorporadas da linguagem adulta, sem que haja nelas evidência de 
que a criança analisa o sinal em unidades discretas. í) que acontece é que a criança 
incorpora, junto com a seqüência fônica, o contexto específico que deu origem àquele 
enunciado, como se vê no exemplo a seguir, selecionado da fala de uma criança de 1; 
7: 
(2) "Tatente" ("tá quente") para denotar café. 
Assim, as formas maduras aparecem, num primeiro momento, em contexto de 
especularidade imediata de algum item da fala adulta. Num momento posterior, ou a 
forma desaparece paia reaparecer adaptada ao sistema fonológico da criança muito 
tempo depois, ou sua forma "menos madura", variável, percorrerá vários meses de 
mudança até se tornar estável. A forma "desviante"  indica reorganizações que a 
criança empreende na sua trajetória lingüística. 
Com as primeiras palavras aparece também a flexão ou a aparente flexão. Digo 
aparente porque em muitos casos não há ainda evidência de que realmente as flexões 
representam morfemas categoriais ou de classes gramaticais como na linguagem 
adulta. Exemplo: 
(3) O possível sufixo -eu, na fala de uma criança,  por volta de 1 ;7 a 1 ;8 
"sendeu" correspondente ao adulto "acendeu", não indica passado, nem pessoa. Pode 
denotar: (i) anunciar aos presentes que acabou de acender ou apagar a luz ou tocar a 
campainha de um telefone de brinquedo ou que está  prestes a  realizar uma dessas 
ações; portanto, neste caso, denota tanto uma ação  completada quanto a intenção 
de realizar uma ação; (ii) pedir ao adulto que faça uma dessas ações?(iii) nomear 
o feixe de luz que entra pela janela. 
O que esse exemplo mostra é que não se pode considerar a desinência  - eu 
como um morfema de tempo e pessoa. Mostra também que o que acontece com o 
significado nesta fase de aquisição é um fenômeno que na literatura é chamado de 
superextensão  ou  supergeneralização,  segundo o qual a faixa semântica de uma 
palavra é alargada a limites muito mais amplos que  na linguagem do adulto (é 
conhecido o exemplo, em português, da palavra "au-au", cujo sentido abarca pelo 
menos todos os animais de quatro patas, o bichinho de pelúcia e a figura de animais). 
Uma possível explicação para a superextensão semântica é aquela não restrita às 
propriedades componenciais do significado da palavra. A criança incorpora, via 
especularidade, todo ou parte do enunciado do interlocutor, emitido naquela situação 
específica. Dá-se, então, um processo chamado de recontextualização, isto é, a 18 
extensão do item em questão para outras interações dialógicas, com a recorrência ou 
a associação a outros discursos. Em muitos casos, não há clara evidência, no começo, 
de segmentação ou análise gramatical propriamente dita. A análise (ou reanálise) se dá 
num estágio posterior, com a reorganização do sistema da criança, dentro de outros 
diálogos. 
Coincidentemente, as primeiras sentenças espontâneas da criança são justaposições de enunciados monovocabulares (de "uma palavra") que ela produz à 
maneira de fala telegráfica. Por exemplo, veja a seqüência de enunciados da fala de 
uma criança de 1:10; 
(4) Babadoi (gravador) 
Chão 
Põe badadoi chão (põe o gravador no chão). 
Os erros ou desvios da norma muitas vezes indicam,  segundo alguns estudiosos, que um processo de análise e segmentação está se instaurando, pois revelam 
as hipóteses que a criança faz sobre o objeto lingüístico. Por exemplo, numa fase 
posterior à produção aparentemente "correta" do sufixo verbal de passado, a mesma 
criança, com 1;11, produz alguns itens que indicam  a adição do sufixo a raízes nãoverbais. 
(5)    Vai lá (observando o pica-pau de brinquedo descendo a haste, bicando-a). 
Vailô (observando a chegada do pica-pau na base da  haste). Guarda (da cama) 
(observando a mãe baixando a guarda da cama). Guardo (emitido após a completude 
da ação por parte da mãe). 
A colocação do morfema fora de seu lugar usual indica que um processo de 
análise está se efetuando e que a criança reorganiza seu sistema para passar para 
outros níveis de análise e aquisição. A partir de 2 a 3 anos, a criança já começa a contar 
histórias. A produção do texto narrativo como tal exige descentração do contexto 
original da história, capacidade de compreender e expressar sucessão e concatenação 
de eventos (que implica, entre outras coisas, dominar lingüística e cognitivamente a 
categoria tempo), relação causai entre eventos e uma provável gramática do texto. No 
começo, a criança ainda não domina estas categorias — sua aquisição, de fato, é 
tardia. O que se dá é a construção conjunta de textos, num jogo instaurado pelo adulto 
e logo incorporado pela criança, que preenche os arcabouços ou "esquemas 
narrativos" subjacentes às histórias ou relatos narrados. A trajetória para a aquisição 
do discurso narrativo é longa: aparentemente, não é antes dos 5 anos que a criança se 
torna uma narradora proficiente. 
O quadro de desenvolvimento lingüístico aqui traçado obedece a uma determinada visão do problema, chamado, genericamente, de interacionista. Obviamente, o quadro seria outro se a interpretação seguisse outro programa científico 
ou outro enfoque teórico. 
5. ALGUMAS CONCLUSÕES
O que você leu nas páginas anteriores é apenas a eleição de alguns temas e o 
esboço de algumas posturas teóricas colocadas no campo da investigação sobre a 
aquisição da linguagem. Tal seleção não esgota absolutamente a eleição de temas, 19 
metodologias e correntes de pensamentos que acompanham o recorte dos fenômenos 
que envolvem a área. 
É preciso, porém, deixar claro que as polêmicas que envolvem as grandes 
questões da área estão ainda em aberto. Se, por um  lado, é pouco afirmar que a 
aquisição da linguagem se restringe à internalização de regras fonológicas, 
morfológicas, sintáticas, semânticas e pragmáticas da língua materna do aprendiz, por 
outro lado é ainda pouco clara a natureza da passagem entre estruturas interativas 
pré-lingüísticas e a gramática adquirida, a natureza do conhecimento lingüístico 
vinculado ou não ao conhecimento do mundo, a dificuldade metodológica causada 
pela falta de transparência da fala da criança (e da própria fala do interlocutor), entre 
tantos outros mistérios. Ainda mais, apesar de recentes avanços no estudo do cérebro, 
pouco se sabe hoje sobre a relação entre conexões neurais e o uso/conhecimento da 
linguagem ou sobre a relação entre mente e cérebro e seu papel nessa aquisição. Em 
outras palavras, o desafio ainda continua a ser a relação entre o inato e o adquirido, 
entre o biológico e o sócio-histórico, entre o lingüístico e o extralingüístico, entre o 
sujeito aprendiz e o objeto a ser aprendido. Felizmente, o campo continua aberto a 
uma gama bem variada de investigações. 
Uma coisa é certa, porém: quando vai para a escola, a criança já percorreu um 
longo caminho elaborando sua linguagem, inserindo-se na língua de sua comunidade. 
Lingüisticamente, a criança não é tabula rasa. Ela é perfeitamente proficiente em sua 
língua materna e continua a aprender outras formas  pertencentes a outras 
modalidades da fala/linguagem, dentro e fora da escola. Isto é, a operar com objetos 
lingüísticos. Assim, a escola vai lhe proporcionar  o acesso a outras "gramáticas" 
pertencentes a modalidades escritas.

Referência

SCARPA, Ester Mirian: Aquisição da Linguagem. In.: MUSSALIM, 
Fernanda; BENTES, Anna Christina (Orgs.).  Introdução à lingüística: 
domínios e fronteiras. São Paulo: Cortez, 2001. pág. 203-232.